Dress code em 3 atos.

#12 Dress code em 3 atos

1o. ato

Estávamos em meados de agosto do ano de 1971, em pleno regime militar vigente à época no Brasil, no período de 1964 a 1985.

Eu, quinto-anista do curso de engenharia eletrônica da Poli-USP, fui convidado por um colega de turma, para fazer estágio no INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais em São José dos Campos.

Toda quinta-feira, eu matava as aulas na Poli e pegava a Dutra para cumprir um dia de estágio por 100 cruzeiros. Na parte da manhã, aulas do programa de mestrado e, após o almoço, trabalho no laboratório Beta em um projeto de pesquisa com balões meteorológicos estratosféricos. Naquela época o INPE já era uma referência internacional em pesquisas sobre clima e monitoramento por satélite de áreas devastadas. Contava com um corpo docente da melhor qualidade, em sua maioria professores do ITA e, outros, convidados estrangeiros (americanos, europeus e indianos).

Apesar de vinculado por decreto presidencial de 1971 ao Conselho Nacional de Pesquisas – CNPq,  portanto civil, o INPE era dirigido por oficiais da Aeronáutica que impunham aos seus colaboradores, disciplina e postura da caserna: cabelos curtos, uso obrigatório de gravata e por aí afora.

Imagine um garoto de 22 anos “que, como eu, amava os Beatles e os Rolling Stones” entrando nesse figurino. Nunca. Foram protagonizadas cenas bizarras de discussão entre o Chefe do Laboratório (Engenheiro Eletrônico e dos bons) e o Diretor Administrativo (Coronel Reformado da Aeronáutica) por conta das sucessivas transgressões às normas disciplinares dos pesquisadores: uso de gravata com camiseta de gola careca (sem gola), cabelos longos ou estacionar o veículo com uma roda sobre o gramado (para aproveitar a sombra das árvores em proteção do sol escaldante de São José dos Campos).    

A verdade é que o INPE não gozava de boa reputação devido a essas picuinhas e algumas pessoas com mais visão, se empenhavam em reter os poucos talentos que ali aportavam, a qualquer custo, uma vez que esses profissionais eram disputados pelas empresas naquela época. Cada formando tinha, no mínimo, 3 opções de emprego, num tempo em que a indústria eletrônica e as telecomunicações explodiam no Brasil. Resultado, evasão em massa.

2o. ato

Mais recentemente, dezembro de 2019, pouco antes da pandemia, eu fazia uma clínica ao ar livre de Access Bars® na avenida Braz Leme (zona norte de São Paulo) quando fui surpreendido por um grupo de jovens (cuja idade devia regular com a minha em agosto de 1971) saindo em bando ao final do expediente, da maior empresa de sistemas do Brasil, todos de bermudas, camiseta regata e sandálias de dedo. Indistintamente, rapazes e moças. Fiquei chocado e me lembrei dos memorandos de advertência que havia recebido há 48 anos!

3o. ato

Há uma semana, flagrei às 11 horas da manhã, numa das ruas mais movimentadas do bairro de Santa Cecília (zona central de São Paulo) um senhor idoso bem vestido, estiloso, desfilando um inusitado traje que nem sei classificar: sapatênis, meia-soquete, bermuda, camisa polo e paletó. 

Fiquei pensando: até que ponto o dress code importa? 

Ensinamento da semana: “Não existe certo e nem errado, o que existe é resultado.”

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